(...) Pedro Páramo é um romance para se ler e reler; e mesmo sendo breve tem leituras intermináveis. Juan Rulfo propõe o romance como signo. O texto começa realista e com um tom mais neutro e descritivo; com o passar dos episódios, a linguagem vai se tornando mais poética e os narradores vão se multiplicando e se contradizendo até que, por fim, o romance se torna fantástico.
A busca de Juan Preciado por seu pai Pedro Páramo, motivo central da narrativa, acaba se tornando mais uma entre dezenas de buscas de um romance onde todos buscam algo que não sabem onde encontrar, e que talvez nem mesmo tenham real consciência do que seja, agindo como que por inércia em um ambiente desolado e triste.
A construção do romance é bastante sutil e as mudanças de realidade são feitas lentamente. Não há precipitação alguma por parte de Rulfo; a transição e comunicação entre o real e sobrenatural, entre sonho e vigília, entre memória e recriação é sempre feita de modo a não dispersar a atenção do leitor da narrativa.
Como em um imenso quebra-cabeça, o texto de Juan Rulfo exige uma leitura atenta porque nada em seu universo se explica, e uma frase ou palavra de determinada página pode esclarecer ou cerrar a sugestão de dezenas de páginas anteriores.
Ao final da leitura, o leitor teve uma experiência única: tem-se a impressão de se ter atravessado um épico de 900 páginas e não escassas 130; e isso se deve ao fato de que o leitor é instigado a interpretar constantemente. E desde a primeira página.
Outra coisa curiosa: o livro não tem trama, roçando com o sutil universo do romance lírico. Começa-se acompanhando Juan Preciado; por um longo momento se vislumbra a infância de Páramo; fragmentos nos contam estórias de vários habitantes de participação episódica na trama; vozes são escutadas por Preciado, que passa a organizar o passado de várias das personagens; há um levante revolucionário; tem-se Suzana, que domina o final do romance. Desse modo, o que condensa e dá unidade ao romance é também uma busca: quem é Pedro Páramo? (...)
Vinicius Jatobá é jornalista cultural e mestre em Estudos de Literatura pela PUC-Rio.
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