domingo, 17 de abril de 2011

Poesia: a melhor auto-ajuda (Ulisses Tavares)

Calma, esperançoso leitor, iludida leitora, não fi­quem bravos comigo, mas ler auto-ajuda geralmen­te só é bom para os escritores de auto-ajuda. Pois não existe receita para ser feliz ou dar certo na vida. Sabe por quê? Porque, na maior parte das vezes, apenas você sa­be o que é bom e serve para você. O que funciona pra um nem sempre funciona para o outro. Os únicos livros de auto-ajuda que dá para se res­peitar, e são úteis mesmo, são aqueles que ensinam no­vas receitas de bolo, como consertar objetos quebrados em casa ou como operar um computador. Ou seja, lidar com as coisas concretas, reais, exige um conhecimento também real, tintim por tintim, item por item. Com gente é diferente. Gente não vem com ma­nual de instruções quando nasce. Nem pra viver nem pra morrer. E, se você precisa de conforto ou de conselhos, existem caminhos bem fáceis, boa parte deles de graça: igrejas, templos, botecos, amigos ou paren­tes... Lembrou? Se alguém anda necessitado de re­gras, palavras de ordem e comandos enérgicos so­bre o que fazer, melhor entrar para o exército. Mas, se você não quer deixar ninguém mandar em você, tenha coragem e encare-se de frente. Não adianta fugir de seus medos, suas dores, suas fragilidades, suas tristezas. Elas sempre correm juntinho, cola­das em você. Tentar ser perfeito, fazer o máximo, transformar-se em outro dói mais ainda. Colar um sorriso no rosto enquanto chora por dentro é para palhaço de circo. Portanto, entregue-se, seja apenas um ser hu­mano cheio de dúvidas e certezas, alegrias e aflições. Aproveite e use algo que, isso sim, com certe­za, é igual em todos nós: a capacidade de imagi­nar, de voar, de se entregar. Se nem Freud lhe explica, tente a poesia. A poesia vai resolver seus problemas existenciais? Provavelmente não. A poesia às vezes é como aquele bordão do Chacrinha, não veio pra explicar, mas pra confundir. Quando acerta é por acaso, como na vida. Ficar confuso é o normal, relaxe e aproveite. (...) O próprio pai da Psicanálise, Sigmund Freud, depois de passar a vida debruçado sobre os misté­rios do sexo, os grilos na cuca, os gritos do corpo, os sussurros da alma, admitiu que aonde quer que ele fosse ou olhasse, um poeta já havia passado por ali. (...) O sábio Mário Quintana já dizia que um bom poema é aquele que nos dá a impressão de que está lendo a gente... e não a gente a ele. (...) Poesia está mais pra lição de vida que lição de casa. Vá em frente. Procure os poetas. Estão todos na livraria, biblioteca ou página da in­ternet mais próxima. Você nunca mais estará tão sozinho a ponto de achar que precisa de um livro de auto-ajuda para mostrar o caminho das pedras. Ulisses Tavares é poeta e autor do livro Se Nem Freud Ex­plica, Tente a Poesia! (Editora Francis, 2006).

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